Assim foi meu percurso até a arte cerâmica: quando jovem pintava, expunha e, até mesmo, fui laureado no Salão Nacional de Belas Artes; mais tarde, ao cursar a ESDI (Escola Superior de Desenho Industrial) me dediquei com especial interesse às técnicas escultóricas nas oficinas de gesso e madeira. Há 17 anos, uma cirurgia me obrigaria a ficar em casa por longo tempo, o que pra mim, inquieto, seria insuportável. Procurando minimizar minha aflição, deram-me, para diversão, um pacote de argila escolar. Foi paixão à primeira vista. Coletei “ferramentas” na caixinha de costura, na bolsa de manicure, na gaveta da cozinha de casa, e por conta própria me aventurei nos caminhos da cerâmica. Caminhos que podem levar o espírito aventureiro a muitos e inimagináveis lugares, como vim a descobrir.
Hoje, no ateliê, o livre trato com a cerâmica me faz sentir como na Pasárgada do poeta Manuel Bandeira: construo (e desconstruo) a peça que quero, com a técnica de modelagem que escolho, usando a argila que me apraz e queimando seja em forno elétrico, a gás ou em processos alternativos. Com efeito, tudo é possível se você compartilha e concerta sua ideia de trabalho com seus parceiros na lide: o barro, o ar, a água e o fogo.
De forma geral, me alinho à “estética da imperfeição” ao valorizar escorrimento de esmalte, rachaduras, bolhas e outros “defeitos” (sic) que, a meu ver, são sinais reveladores do processo orgânico e complexo da arte cerâmica.
Meus trabalhos, inda que diversos, apresentam duas visões principais, ambas orgânicas, naturalistas. Uma é figurativa e a outra aurida no esplendor da natureza com que convivo em Petrópolis: raízes, folhas, troncos, etc. E mais: nas peças não figurativas, abstratas, uso ajuntar pequenas borboletas, pássaros, lagartixas, buscando introduzir algum sopro de vida na cena inerte. Com relação à vertente figurativa, importa dizer que já em minhas jovens pinturas me interessava representar pessoas negras; e assim continuo no trato com a argila, inspirado em obras etnográficas de referência, como as de Pierre Vergé e do amigo antropólogo Raul Lodi.
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